Rebaixamento do Grêmio em 2004

De Grêmiopédia, a enciclopédia do Grêmio
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Com a finalidade de detalhar o período histórico do Grêmio que culminou no rebaixamento em 2004, nós da Grêmiopédia criamos um artigo narrativo com fatos sobre um dos piores momentos da história do clube. A ideia de reviver situação de tamanha dramaticidade é recordar fatos que, em circunstâncias não planejadas, poderiam resultar em novos momentos de mesma magnitude.

Manter viva a história também é um trabalho de evitar que os erros sejam esquecidos e repetidos.

Do fim de uma era

Elenco do Grêmio em 1998
Fonte: torcedorgremista.nom

Nos anos 90 o Grêmio viveria um período de grandes glórias, com a conquista da Libertadores, Copa do Brasil, Recopa e Campeonato Brasileiro, manteríamos uma hegemonia nacional rivalizando com equipes como o Palmeiras, à época dono de um plantel recheado de estrelas adquiridas com o patrocínio da multinacional de laticínios Parmalat.

Os fracassos nas temporadas de 1998 e 1999 levantariam uma pergunta pertinente para a época: seria a hora de buscar uma parceira para financiar o futebol? Foi diante de tal contexto que 24 de novembro de 1999 o então presidente do clube, José Alberto Machado Guerreiro, decidiria firmar parceria com a empresa de marketing esportivo International Sport and Leisure (ISL).

Os moldes da negociação definiriam que o Grêmio manteria controle sobre o departamento de futebol, sendo que a ISL transferiria ao clube o valor de US$ 50 milhões (R$ 97 milhões) em 2000. Dentre as promessas da parceria, haveria uma reformulação do estádio Olímpico, com a construção de um shopping interno e a ampliação de estacionamento.

Em declaração noticiada pelo repórter Léo Gerchmann, da Folha de São Paulo [1], o então presidente afirmaria "Não admitimos entregar o departamento de futebol a uma empresa. O futebol é do Grêmio, é movido a paixão".

Grêmio tetracampeão da Copa do Brasil

No dia 19 de junho de 2000 o Grêmio oficializaria a parceria com a ISL[2], em um contrato de 15 anos. Segundo noticiado pela Folha, o Grêmio receberia R$ 50 milhões, sendo, R$ 25 milhões destinados a contratações de jogadores e R$ 25 milhões a despesas operacionais.

Como pode ser visto em nosso artigo sobre o Elenco do Grêmio em 2000, com os valores destinados ao clube contrataríamos Ânderson Lima, Astrada, Amato, Paulo Nunes, Zinho, entre outros atletas. Alguns valores obtidos em nossas pesquisas demonstram as movimentações astronômicas para a época.

Como resultado, entretanto, o ano de 2000 foi decepcionante, contratações que não corresponderam aos valores milionários de suas compras e insucessos dentro de campo fariam que passássemos a temporada sem grandes conquistas. O Grêmio iniciaria 2001 com grandes expectativas, de fato seria conquistado o tetracampeonato da Copa do Brasil, mas o contexto de investimentos havia criado uma esperança de outros grandes troféus, o que não ocorreu.

A falência da ISL e o início do desastre

Em 2001 ocorreria o pior, a ISL declararia publicamente sua incapacidade financeira. Com uma perda de 372 milhões de dólares e envolvida em escândalos, até mesmo o presidente da FIFA, Joseph Blatter, sofreu com risco de perda de seu cargo, conforme noticiaria o jornal suíço dimanche.ch.

Como resultado direto ao Grêmio, houve o não-recebimento de valores prometidos com a parceria, sendo o clube o único responsável pelos débitos de salários e contratações. Conforme pesquisa sobre os elencos de 2001 e 2002, os contratos foram na maior parte mantidos, o que resultaria na maior crise financeira do clube, um rombo astronômico consequência de obrigações com jogadores acima das capacidades financeiras do Imortal.

Condenação do presidente em primeira instância e prescrição

Presidente do Grêmio, José Alberto Guerreiro ao lado de faixa contra a venda de Ronaldinho, que sairia sem contrapartidas ao Tricolor logo depois
Fonte: Artilharia Gremista

Em 4 de outubro de 2007 o Estadão noticiaria a condenação do ex-presidente do Grêmio, José Alberto Machado Guerreiro, a dois anos e dois meses de prisão, pena convertida em prestação de serviços à comunidade[3]. Nos termos da reportagem, o mandatário gremista teria cometido o crime de estelionato.

Segundo noticiado pela RBS[4], em agosto de 2000 a ISL do Brasil emitiu três cheques em nome do Grêmio totalizando R$555.799,00, valor destinado ao pagamento de multas relativas à contratação de Amato, Astrada e Paulo Nunes. Ocorre que após a falência da ISL, ficou constatado que nos três casos não havia sido cobrada a multa e nenhum dos clubes envolvidos nas transações havia recebido o dinheiro. Em produção de provas, restou identificado que os cheques foram endossados e depositados em contas de terceiros.

Além da pena restritiva de direitos, a magistrada Kátia Elenise Oliveira da Silva, da 1ª Vara Criminal de Porto Alegre, condenaria Guerreiro e Cardia, executivo da ISL, a pagar ao Grêmio, cada um, 360 salários mínimos (R$ 136,8 mil) e mais 150 salários mínimos da época dos fatos que constavam no processo[5].

Em 27 de março de 2008, diante da prescrição da pena, José Alberto Machado Guerreiro e Wesley Cardia seriam absolvidos pela 7ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Tanto o valor dos cheques que não chegaram aos cofres do Grêmio quanto a multa pecuniária imposta aos acusados não necessitariam mais serem pagas ao Tricolor[6].

A crise financeira e o quase rebaixamento

Foto da goleada por 3x0 que salvou o Grêmio na última rodada
Fonte: Grêmio Dados

A ausência dos repasses financeiros somados a manutenção de contratos astronômicos resultaria em uma crise sem precedentes no Grêmio. Com impossibilidades financeiras, o então presidente Flávio Obino realizou a venda de praticamente todo elenco da temporada anterior, conforme pesquisa realizada no artigo do Elenco do Grêmio em 2003.

Em pouco tempo seria possível identificar os problemas técnicos resultante do caos financeiro. As contratações não corresponderam em campo e, no ano do centenário, o clube comemoraria seus 100 anos na lanterna do Campeonato Brasileiro de 2003, após um empate por 1x1 contra o Bahia, em 13 de setembro.

A salvação do Imortal viria apenas na última rodada do Brasileiro, uma vitória por 3x0 contra o Corinthians em 14 de dezembro seria a salvação do Grêmio.

Caos dentro de campo e fora

O prelúdio do caos ocorrido em 2003 não serviu para um melhor planejamento na temporada seguinte, pelo contrário, o ano de 2004 ficaria marcado com um aproveitamento de 39%, um dos piores da história do clube. No Brasileirão, apenas 9 vitórias e 12 empates resultaria em um aproveitamento de 28% e última colocação.

O time seria rebaixado em 28 de novembro, no empate em 3x3 contra o Athletico Paranaense, com três rodadas de antecedência, disputando a segunda divisão do ano seguinte aos frangalhos, com dirigentes sugerindo, inclusive, o fechamento do futebol profissional[7].

Festas de jogadores e falta de comprometimento

Fora de campo a situação financeira contaria com outro fator para o rebaixamento, a indisciplina e descomprometimento. Segundo relatos do lendário presidente e exemplar gremista Hélio Volkmer Dourado[8], mesmo no momento desesperador do clube, alguns atletas faziam festas regadas a álcool e música alta, até mesmo no ônibus da delegação.

Em 2014, jogadores como Cláudio Pitbull relataram que o grupo era muito bagunçado, apesar de entender que tinha qualidade. Já o treinador Cláudio Duarte vai além, destacando para o site Globo Esporte o panorama vivido:

A receita do rebaixamento era a mesma de outros clubes. Embora a crise financeira seja citada como fator preponderante, é inegável pelos relatos que a instabilidade e descomprometimento de jogadores resultaria no agravamento do quadro e nem mesmo as derrotas serviriam para que houvesse mobilização de parte do elenco.

É nos relatos do treinador Claudio Duarte que se extrai a essência do rebaixamento: "O Grêmio foi rebaixado com méritos. Um resultado adequado à campanha, ao comportamento dos jogadores e à realidade financeira. Foi um trabalho difícil. É um peso que carrego comigo até hoje".

Referências